sexta-feira, 12 de outubro de 2012

O Hugo saiu. Estive a ouvir um álbum antigo de uma banda portuguesa que desapareceu. Um álbum que ouvi em viagens silenciosas com o Hugo até Lagos, há tantos anos que não consigo contar... no tempo em que tudo estava bem entre nós.
Nunca percebi como gostava tanto daquelas letras que em nada identificava a nossa relação e que hoje me fizeram chorar. Chorar muito. Chorar uma vida inteira. De tanto que podiam ter sido escritas por mim...
Preciso de me encontrar... aos 33 anos ninguém se reencontra porque nunca se encontrou. Por isso sei que preciso de me encontrar. Se calhar preciso de um psicólogo... ou apenas de chorar. Que é coisa que aparentemente precisa de um CD cheio de pó, como este. Que ouvi sofregamente e que me deixou vazia de tudo para me poder deitar e dormir mais leve.
Porque será que tenho saúde, emprego, uma casa, comida no frigorífico, uma filha linda e mesmo assim não chega para me deitar em paz? Não percebo. Não percebo como cheguei até aqui, tão perto e tão longe de tudo o que imaginei para mim? Como cheguei até aqui tão incapaz. A palavra é essa: incapaz... Não sou nada do que ninguém vê em mim, eu sinto-o a cada tropeção nas teimosas evidências de fracasso. Teimosas porque contrariam ostensivamente aquela que podia ser a minha imagem.
Perdi-me algures, devo ter adormecido... vi o princípio do filme, apanhei o fim. E nem sei o título do filme para o poder procurar e tentar ver sem pestanejar, na esperança de que o enredo não seja demasiado complexo para chegar ao fim e perceber... finalmente perceber.
Fiz com certeza alguma coisa errada no caminho entre as viagens para Lagos e esta casa onde vivo com a mesma pessoa que fez comigo essas viagens. Virei mal à direita, ou à esquerda... ou não. Já sei...! Fui sempre a direito, estrada fora, caminho recto. E a vida não é assim tão geométrica, ou será?. Não é paralela como desejava que fosse nos momentos em que oscilo entre a euforia histérica de quem redescobre sensações perdidas e a tensão de uma culpa antecipada porque nada disso era suposto. Nada disso é certo. Mas também não é bem perpendicular, como se bastasse virar aqui ou ali para sair do trajecto, como nos momentos das supostas grandes decisões.
Não. A vida é curvas e mais curvas onde enjoamos o dia-a-dia... onde enjoamos as rotinas, onde vomitamos a inércia em ouvir os outros, em nos ouvirmos. Afinal há geometria na vida.
A vida... sempre a palavra na boca de meio mundo, ora porque está cara, ou difícil, ou complicada ou por compreender... essa sequência de curvas e contra-curvas, tantas delas apertadas, zonas de acidentes que sempre se anteciparam. Acidentes que foram os mesmos desde há séculos infinitos.

«I'm looking back to time
Trying to rewind
I feel so far from where I've been
I'll reach you in the sky»

No céu azul de Lagos, no vento que sempre nos perseguia...

quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Gosto de duvidar. Não sei porquê, se ao fim e ao cabo nunca duvido mesmo, é só duvidar por duvidar. Quem sabe se por ter tantas certezas, duvidar não seja a forma de as testar. Toda a maneira, duvido.


Neste momento duvido que seja capaz de passar no exame de condução. Bem sei que ainda faltam aulas até lá (muitas por sinal) mas, a esta distância, mais não consigo fazer do que duvidar e sentir aquele quase friozinho na barriga (digo quase porque não chega a ser!) e pensar que não vou ser capaz.

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Nada de especial, no princípio

Suponho que a vida começa quando dela guardamos primeiras lembranças...

A minha primeira memória é relativa ao nascimento da minha irmã, as seguintes já só aparecem com a entrada na escola, três anos depois. Lembro-me exactamente da chegada á escola no primeiro dia de aulas de um chuvoso mês de setembro. Lembro-me do nome da colega de carteira: Gisela. E foi ela a primeira amiga com quem me zanguei.

As restantes memórias vêm em golfadas.

Nada de especial: um primeiro amor, Paulo. Um segundo, Manuel. Uma grande amiga, a primeira melhor. Elogios constantes á escrita e á leitura. Muitos dissabores a Matemática. Uma professora simpática. Muita conversa e jogo do lenço, a mamã dá licença e a cabra cega. Uma colega muito mais velha e com um atraso grande a nível cognitivo a quem me lembro de proteger e de quem me lembro de gostar. Uma primeira inimiga de estimação e a primeira vez que me lembro, verdadeiramente, de estar em competição.

Nada de especial.

Apenas as folhas de outono no caminho e as folhas dos blocos de colecção. E a primeira vez que perdi algo de que realmente gostava: a minho colecção. Tinha mais de 100 folhas. Tinha tantas que nem as sabia contar, ainda. Até porque os números nunca foram o meu forte.

Nada de especial, mesmo.